Page 36 - Reflexão sobre São José
P. 36

sentimos dentro de nós um pensamento, uma palavra, um sentimento que não vinha de nós. Alguma
     experiência  ou  pessoa  que  nos  lembrou  que  nem  tudo  se  passa  no  plano  horizontal  das  coisas
     humanas e que na vida, para quem sabe agarrar e olhar profundamente, existem muitos pontos de
     encontro com o céu. Não procedemos apenas horizontalmente. Pense na "grade geográfica" formada
     por paralelos e meridianos: quantos pontos de encontro. Nossa vida como a de José não é só nossa. O
     vínculo com os outros, um encontro e uma experiência de vida significativa, o desejo de ser melhor,
     a percepção dos nossos limites, das nossas fragilidades, são alguns dos pontos de encontro entre o
     céu e a terra; eles são, em certo sentido, nossos "paralelos" que se cruzam com os "meredianos" do céu.

     A vida de Joseph sugere que a experiência de cada homem e mulher é um confronto contínuo com o
     céu.  A  Venerável  Anne  Marie  Medeleine  Delbrêl,  mística  e  poetisa  francesa  escreveu  que  “cada
     pequena ação é um evento imenso no qual nos é dado o paraíso, no qual podemos dar o paraíso. O que
     importa o que temos que fazer. Tudo o que fazemos não é senão a casca da esplêndida realidade, o
     encontro da alma com Deus, renovado a cada minuto, cada minuto aumentado em graça, cada vez
     mais  belo  para  o  seu  Deus  ”.  Para  esta  mulher  do  nosso  tempo,  até  os  compromissos  e  os
     inconvenientes são ocasiões em que Deus e os homens se encontram: “Eles brincam? Logo vamos
     abrir: é Deus quem vem nos amar. Uma informação? Aqui está: é Deus quem vem para nos amar. É
     hora  de  sentar  à  mesa?  Vamos  lá:  é  Deus  quem  vem  para  nos  amar.  Deixemos  fazer  ”.  É  uma
     característica que o aproxima de muitos buscadores incansáveis da "vida plena".

     Outro motivo que faz com que este "gigante da fé" não esteja longe de todos os seres humanos
     nos é sugerido pelas histórias da infância de Jesus. O Filho de Deus nasceu em um contexto
     difícil  e  complicado,  assim  como  a  existência  de  tantos  homens,  comparável  a  um  pêndulo
     oscilando  entre  momentos  felizes  e  tristes.  As  dores  e  alegrias  de  São  José  lembram  esta
     alternância de alegrias e sofrimentos. Eu me pergunto como devem ter sido os pensamentos de
     José nos dias em que Deus decidiu se tornar um homem entre os homens. Certamente não muito
     longe  da  nossa  quando  fazemos  de  tudo  para  não  perder  a  fé  diante  de  situações  cada  vez
     maiores, capazes de desmontar certezas e convicções sem misericórdia, como a morte de um
     ente querido, a perda do emprego ou a insurgência de uma doença grave. José constantemente
     cruza o caminho de Deus porque ele escolheu deixar a vida falar. Sempre que os acontecimentos
     narrados pelos Evangelhos parecem negar o que o anjo em sonho havia comunicado ao nosso
     carpinteiro de Nazaré, especialmente que "não temas", Deus intervém. Como na vida de José,
     também pela nossa talvez possamos falar de um Deus oculto, talvez silencioso, mas certamente
     não ausente: devemos poder interceptá-lo. Não é uma tarefa fácil, mas não impossível, contanto
     que você olhe cada vez mais fundo sem parar na superfície dos eventos.

     Ele é um Deus escondido, mas não ausente talvez porque o Todo-Poderoso gosta de pedir a si mesmo,
     não de se impor. Este também é um aspecto que aproxima este homem manso daqueles que lutam,
     apesar das adversidades da vida, para manter a fé e continuar a acreditar e a ter esperar.

     José deixou-se conduzir pelo Senhor. O carpinteiro de Nazaré nos encaminha para uma santidade
     anônima e não ostentosa, não feita de atos heróicos mas que se expressa no pequeno, no cotidiano,
     no usual: “se o pecado é a banalidade do mal, a santidade é a normalidade do bem " Quanto mais nos
     aproximamos de Nazaré, mais Deus cresce no mundo. A fé tem a ver com a experiência diária de cada
     pessoa e família. A nós que vemos como a vida quotidiana é exaustiva e que muitas vezes lutamos
     para ligar a fé à vida quotidiana, José ensina que cada realidade humana pode tornar-se um sinal da
     presença de Deus, em cada acção, a cada momento pode brilhar o reflexo de uma realidade mais.
     ótimo. Por isso José continua sendo um de nós.
       14

       14    Reflexões sobre s. josé
   31   32   33   34   35   36   37   38   39   40   41