Page 98 - Reflexão sobre São José
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No campo sexual, por exemplo, o que a Igreja no passado tentou regular com riqueza de detalhes,
     hoje nos parece ser uma esfera de gestão puramente pessoal. Por outro lado, somos muito mais
     sensíveis à dor dos outros, ao respeito, ao sofrimento de certas classes, à discriminação de todos
     os tipos, ao racismo, à tolerância, às diferenças, à ecologia...

     A consciência que temos dos nossos direitos impede-nos de aceitar passivamente quaisquer
     maus  tratos,  violência  psicológica  e  humilhação  (parte  integrante  de  certa  pedagogia  do
     passado), intimidação e exploração por parte de quem quer que seja. E, sobretudo, valorizamos
     a pessoa pelo que ela é: não importa se tem dinheiro, se é bispo ou cardeal, se tem cartas de
     recomendação, se representa alguma grande pessoa, se tem nomeações políticas, etc. É por isso
     que tantas injustiças dentro das nossas comunidades, a princípio consideradas insignificantes,
     são hoje mal toleradas e tornam-se fonte de insatisfação e causa de abandono da Vida Religiosa.

     Percebemos que neste ano de São José, em vista de uma futura recuperação do nosso genuíno
     espírito de família, temos muito a fazer. O primeiro passo, na minha opinião, é investir tempo e
     energia não na recuperação do velho molde (como alguns gostariam), mas em acionar aqueles
     mecanismos de participação (já não tão novos!) previstos em nossas Regras.

     (Para não prolongar demasiado este que quer ser um simples artigo, sem outra pretensão que
     não  seja  provocar  uma  reflexão  e  talvez  um  debate  comunitário),  toco  ligeiramente,  como
     exemplo, o caso dos nossos Conselhos de Comunidade. Não é verdade que em muitos lugares
     (não  por  malícia  de  ninguém,  mas  por  inexperiência)  tornaram-se  uma  mera  reunião
     programática, onde a partilha de opiniões e a participação nas decisões são consideradas uma
     perda de tempo? Não é verdade que muitas decisões que afetam a vida pessoal dos membros
     ainda são tomadas “de cima”, sem a mínima consideração pelas necessidades individuais? Não
     é verdade que, se por acaso o superior deixa a palavra livre, muitas vezes encontra o silêncio,
     porque a comunidade não está habituada a esse procedimento que, passados mais de 50 anos do
     Concílio, continua a ser estranho para nós?

     Sim, temos um longo caminho a percorrer para uma vida de verdadeira fraternidade, onde os
     membros de uma comunidade amem-se, respeitem-se, aceitem-se e cuidem-se uns aos outros, e
     sejam capazes de correção fraterna. E os superiores exerçam mais autoridade e menos poder. A
     isto eu chamaria um caminho que promete ser longo, lento e acidentado, cuja não se vê bem com
     a vista humana, mas – como dizer? – contigo, ó José, temos a certeza de caminhar sempre bem.











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