Page 102 - Reflexão sobre São José
P. 102

São José é apresentado no Evangelho como aquele que escuta a mensagem e, sem divagações,
         atrasos,  desculpas  e  pedidos  de  explicações  e  esclarecimentos,  a  põe  em  prática.  É
         interessante notar que esta escuta é feita nas circunstâncias da vida cotidiana, no silêncio da
         noite e através do sonho. Portanto, é claro que a missão de José depende da palavra, e que
         através  da  palavra  ele  entra  em  uma  relação  com  Deus.  A  atitude  de  ouvir  é  um  aspecto
         essencial  de  seu  modo  de  vida  e  envolve  sua  interioridade:  é  nela  que  ele  percebe  as
         mensagens  e  ajusta  sua  conduta.  Por  outro  lado,  a  resposta  de  José  não  é  formulada  em
         palavras,  mas  se  manifesta  na  ação,  de  modo  que  a  exortação  apostólica  reitera  que  "os
         Evangelhos falam somente do que José ‘fez’". (n.º 25), sem nenhuma palavra sua. Quatro
         vezes ele sonha, e cada vez que recebe apenas uma mensagem e uma explicação parcial.

         José ouve na interioridade de seu ser, isto é,  "no coração", que na antropologia bíblica
         não é sede de sentimentos e emoções, mas do intelecto e da identidade pessoal. Projetos
         e escolhas amadurecem no coração e decisões e julgamentos brotam dele. O coração é o
         órgão com o qual Deus é "ouvido": nele se mede a verdadeira dedicação a Deus, e através
         dele pode-se discernir a ordem do mundo e da vida segundo os ensinamentos divinos
         (M. Pina Scanu).

     4.2. EM PRESENÇA DO MISTÉRIO, SILÊNCIO

         O silêncio, pedra angular e guardião da interioridade, é reconhecido pela tradição espiritual
         como elemento essencial para uma autêntica vida espiritual e de oração.

         O nosso santo em silêncio procura discernir a vontade de Deus e depois, sem comentários,
         deixa Nazaré com a jovem esposa grávida, para ir a Belém; e ali, em silêncio, contempla o
         milagre do nascimento do Filho de Deus, a chegada dos pastores e a visita dos Magos. Ao lado
         da manjedoura, depois do nascimento de Jesus, ouvimos não só o cântico dos anjos, a voz dos
         pastores e as sábias palavras dos que vêm do Oriente, mas também percebemos a presença
         silenciosa do esposo de Maria. Também ele assume a atitude de Maria que "conservava todas
         essas coisas, meditando-as em seu coração" (Lc 2,19).

         O texto da exortação apostólica acrescenta: "Também quanto ao trabalho de carpinteiro na
         casa de Nazaré se estende o mesmo clima de silêncio, que acompanha tudo aquilo que se
         refere à figura de José. Trata-se, contudo, de um silêncio que desvenda de maneira especial o
         perfil interior desta figura. Os Evangelhos falam exclusivamente daquilo que José «fez»; no
         entanto, permitem-nos auscultar nas suas «acções», envolvidas pelo silêncio, um clima de
         profunda contemplação." (25).

     4.3. A LUTA INTERIOR

         Na  interioridade  do  coração,  lugar  da  luta  espiritual,  entre  as  diferentes  possibilidades,
         opções, pensamentos, sugestões e dinâmicas, realiza-se o processo de discernimento de José,
         uma categoria de espiritualidade inaciana, proposta com nova força no pontificado do Papa
         Francisco.

       80

       80    Reflexões sobre s. josé
   97   98   99   100   101   102   103   104   105   106   107