Page 13 - Reflexão sobre São José
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evangelizadora". Sem os momentos reservados exclusivamente ao estar com o Senhor, as pessoas
          consagradas tornam-se pouco a pouco como os ramos desprendidos da videira e pouco a pouco o
          sal da vocação religiosa perde seu sabor.

          São José – carpinteiro ocupado e contemplativo

          Inspirando-me nas afirmações feitas e aproveitando o Ano de São José que, entre outras coisas, nos
          convida a reler a Exortação Apostólica Redemptoris Custos 30 anos após a sua publicação, gostaria de
          chamar a atenção para um aspecto do retrato de São José pintado nas páginas deste documento. E
          a finalidade da minha carta é estimular a reflexão e o estudo sobre a necessidade de uma maior
          harmonia entre o nosso ser cartuxos e apóstolos, ou seja, entre o amor contemplativo e o amor de
          serviço que devemos unificar na vida e na missão.

          Durante  muitos  séculos,  acreditou-se  amplamente  que  a  contemplação  era  uma  atividade
          reservada  a  monges  e  religiosos  por  causa  de  sua  suposta  incompatibilidade  com  a  atividade
          secular  vista  como  um  obstáculo  intransponível.  Para  tornar-se  contemplativos  teria  sido
          necessário, portanto, deslocar-se para lugares solitários.

          No entanto, o Guardião do Redentor nos oferece uma interessante lição sobre o tema que estamos
          focalizando, porque à primeira vista ele não atende à exigência mencionada. Vivendo no mundo,
          São José foi obrigado a cuidar das tarefas diárias e a manter constantemente uma rede de contatos
          sociais e profissionais. Além do tempo passado nas ruas da Palestina, suas atividades não parecem
          ser  as  mais  favoráveis  para  manter  a  tranqüilidade,  considerada  como  outra  condição  para
          contemplar: como esposo, conhece o sabor da crise matrimonial e passa o tempo em discernimento
          (cf. Mt 1,18-24); como pai em aflição, procura seu Filho por três dias, e não consegue compreender
          a ação do adolescente de 12 anos que, sem explicação, se afasta (cf. Lc 2,50); como trabalhador,
          certamente  terá  experimentado  a  precariedade  de  sua  profissão.  De  resto,  como  refugiado,  é
          obrigado a deixar o seu país com a família para escapar à ira de um tirano obcecado pelo poder (cf.
          Mt 2, 14.15).

          No entanto, a história da espiritualidade associa o nosso Santo Carpinteiro, envolvido nas tarefas
          diárias,  ao  homem  contemplativo.  A  exortação  apostólica  Redemptoris  Custos  afirma  que  só
          aparentemente  os  Evangelhos  privilegiam  a  sua  vida  ativa  falando  exclusivamente  do  que  José
          "fez", mas nos permitem descobrir em suas "ações", envoltas em silêncio, um clima de profunda
          contemplação. José estava em contacto diário com o mistério "escondido há séculos", que "fixou
          residência" debaixo do teto da sua casa". (RC 25). "Ao seu trabalho de carpinteiro na casa de Nazaré
          estende-se o mesmo clima de silêncio" (ivi).

          José, homem justo, esperava a vinda do Messias, escutando e meditando as promessas messiânicas
          dos profetas. Seu primeiro encontro com Jesus aconteceu quando ele ainda estava escondido no
          ventre de Maria. Depois, avança pelo caminho da contemplação, testemunhando a adoração dos
          pastores  que  chegaram  ao  lugar  do  nascimento  (cf.  Lc  2,  15-16);  o  seu  coração  enche-se  de
          admiração ao presenciar a homenagem dos Magos vindos do Oriente (cf. Mt 2, 11); e, depois, na
          circuncisão, cumprindo as disposições da Lei mosaica, ele tem o privilégio de pronunciar e impor
          ao menino o nome de Jesus, que lhe tinha sido revelado no momento da sua "anunciação": "E tu o
          chamarás Jesus, porque ele salvará o seu povo dos seus pecados" (Mt 1, 21).

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                                                             Reflexões sobre s. josé
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